Dialogando com impressões, emoções e palavras de um encontro inspirador com Jaakko Seikkula.
Quando convidamos Jaakko Seikkula para um workshop sobre a Abordagem do Diálogo Aberto, esperávamos ouvir e aprender um pouco sobre esta proposta desenvolvida inicialmente na longínqua Finlândia desde os anos 80, e que aos poucos vem se disseminando através de pesquisas e publicações, formação e encontros como este que o NOOS organizou em São Paulo nos dia 5 e 6 de abril. Uma boa medida do grande interesse atual por essa abordagem constatar que, dentre os inscritos, havia profissionais de contextos diversos de formação e prática que vieram inclusive de outras cidades e estados do país. Percebemos, antes mesmo do workshop começar, uma curiosidade compartilhada com muitos por uma proposta que vem se tornando conhecida entre nós, todos na expectativa de saber um pouco mais e entender como trazer algo da maneira finlandesa de trabalhar para as nossas práticas, sobretudo na saúde mental. Assim, começamos o primeiro dia do workshop com muita vontade de aprender sobre a postura dialógica e de como vem contribuindo para mudar para melhor os serviços de psiquiatria nos lugares onde tem sido desenvolvida.
“A vida é por sua própria natureza, um diálogo aberto.
Viver significa participar em diálogos: fazer perguntas, escutar, responder, concordar, e assim por diante.
As pessoas participam completamente nesse diálogo. Com seus olhos, mãos, lábios, alma, espírito.
Com seu corpo inteiro, com seus atos.”
A maneira como Jaakko Seikkula nos apresentou à Abordagem do Diálogo Aberto foi nos convidando a ouvir e pensar primeiramente sobre “diálogo” “relação”, “mente”.Fomos convidados a pensar que as vozes na nossa mente são as vozes das relações e que as relações se tornam nosso ser corporificado. E, uma vez que respondemos com nosso corpo todo, é importante usar as sensações, falar dessas sensações em nossas interlocuções. A compreensão de diálogo entre as vozes que carregamos como a nossa experiência humana básica, foi ampliado e enriquecido. E algo desafiado, pois nossa maneira habitual de pensar em diálogo, interação, conversa terapêutica, mudança, ressignificar, passa pela primazia das palavras e das narrativas faladas em nossas interações. Primeiro aprendizado: 90% do que acontece num diálogo ocorre fora das palavras ditas, a maior parte de nossa expressividade passa pelo corpo. Seikkula nos apresentou os autores que sustentam as ideias de mente relacional, da experiência humana como um fluxo contínuo de vida, do movimento como primeira linguagem, e das sensações no corpo guiando nossa interação, nossas respostas. E acompanhados desses autores e ideias, nos propôs pensar/sentir – refletir – conversar sobre as consequências desta maneira de entender o ser humano, as relações, seus problemas e uma nova maneira de fazer encontros terapêuticos com famílias e redes. E uma vez envolvidos pela compreensão da dialogia, fomos apresentados à ideia da psicose como um evento da vida e uma resposta estratégica da mente para sobreviver a eventos e experiências difíceis, uma forma de conhecimento que ainda não encontrou palavras para ser comunicado. Seguimos para a história do desenvolvimento da abordagem do Diálogo Aberto, seus princípios e sistematização da prática através de estudos e pesquisas, as variações de aplicação da abordagem nos diversos contextos clínicos. Segundo aprendizado: “não há mudança sem pesquisa”. Não, não basta fazer algo diferente - é preciso descrever, sistematizar, documentar, replicar, publicar. Jaakko nos alerta: muito mal foi feito no campo da terapia familiar ao negligenciarmos e ignorarmos a necessidade de pesquisa. É necessário aprender coma as falhas, aprender a fazer melhor, numa pesquisa que emerge da prática – isso é pesquisa sistêmica. Sua validade, afirma, é até melhor do que os estudos controlados porque a validade externa é maior. Em suma, aprendemos também sobre a construção de evidências para conversar com as diversas comunidades de prática e científica, e construir credibilidade para propor uma mudança sistêmica. Assim chegamos ao final do primeiro dia com uma cesta cheia de emoções e aprendizados e uma rica colheita de palavras, levando para casa: disponibilidade, respeito, desafio, inspiração, flexibilidade, diálogo, sutileza, sensibilidade, visceral, simplicidade, é possível, curiosidade, inclusão, esperança, humildade, conexão, potência, coragem, sintonia, presença, corporeidade, responsividade, acolhimento, escuta, ética, incompletude, afetividade, coerência. O segundo dia começou com a presença de uma família que generosamente se voluntariou, junto com seus terapeutas, para conversar ao vivo com Jaakko. E então tivemos a oportunidade de vivenciar, nos emocionando e aprendendo nessa emoção, a postura dialógica em ação num contexto de conversa terapêutica. A conversa após o atendimento deu espaço a muitas reflexões compartilhadas, e nos levou ao espaço de fechar o encontro com o compartilhar de aberturas para práticas dialógicas em contextos diversos. Reconhecer o que já fazemos e acolher inciativas nascentes em nossas práticas. Terceiro grande aprendizado: viver dialogicamente e buscar a sintonia com o outro no momento presente, com nosso corpo, mente e espírito, é um processo de nos reconectar com aquilo que já praticamos desde que nascemos. A possibilidade de conversar, refletir e aprender mais sobre o alcance desta postura em cada uma de nossas relações e contextos de prática é o convite para continuar essa conversa e nos inspirar em ações futuras. O Instituto NOOS é grato a esta oportunidade e quer levar adiante a conversa. Quem quer participar?